terça-feira, 14 de abril de 2009

Remontagem de obra de Chico Buarque e Paulo Pontes estréia quinta-feira



(O Globo - 21/10/2007)

Alessandra Duarte

O Rio de Janeiro terá novamente a sua "Gota d'água". Trinta e dois anos depois do sucesso que o texto de Chico Buarque e Paulo Pontes fez com a voz e a atuação de Bibi Ferreira, protagonista da montagem original de 1975, a atriz Izabella Bicalho correu atrás do projeto e agora fará a Joana que foi de Bibi, na primeira remontagem carioca do musical. O espetáculo estréia nesta quinta-feira, dia 25, no Teatro Glória, com direção de João Fonseca, diretor do grupo F... Privilegiados.

A ex-Narizinho do "Sítio do Picapau Amarelo", que já atuou em musicais como "South American way" (sobre Carmen Miranda) e "Somos irmãs" (sobre Linda e Dircinha Batista), interessou-se por remontar "Gota d'água" há três anos. Reservou os direitos da obra, procurou produtores, chegou a convidar Bibi Ferreira para dirigir o espetáculo (ela aceitou, mas depois, por problemas de agenda, deixou a direção), no fim fechou com João Fonseca, responsável por êxitos de público e crítica como "Escravas do amor". O esforço para conseguir o que quer é o que Izabella mais admira na personagem que viverá no palco do Glória.

- Acho que o maior símbolo da Joana é a luta. Se me identifico com ela em alguma coisa, é nisso - diz Izabella Bicalho, hoje com 35 anos, sobre a personagem que mata os filhos no fim, numa inspiração no mito grego de Medéia. - Apesar de haver esse desespero final, o tempo inteiro ela vive nos seguintes termos: "O que eu posso fazer nessa situação?". A Joana sempre acha que pode fazer as coisas acontecerem, para ela e para aqueles de que gosta. Quando Jasão ainda estava começando na carreira (em "Gota d'água", o personagem grego virou um sambista), ela vai até o amado e diz: "Você sabe que pode ser bom".

Para Izabella Bicalho, a disposição de Joana para a luta de todos os dias é o que faz o público brasileiro, sobretudo o feminino, identificar-se com ela.

- Depois que Joana dá força para o Jasão (vivido por Lucci Ferreira), e o companheiro começa a fazer sucesso, ele vira as costas para ela. Esse abandono e essa decepção também fazem com que toda mulher se identifique com ela, né? - brinca Izabella. - Aliás, acredito que, até por uma questão de identificação com a platéia brasileira, o texto muda o final da tragédia grega e faz com que a Joana se mate depois de matar os filhos. Na história grega original, ela mata os filhos e vai embora, mas no Brasil, com esse sentimento de maternidade que a gente tem aqui, não dava.

Com a presença de quatro músicos tocando ao vivo durante as apresentações, a remontagem de "Gota d'água" terá cinco músicas que não estavam na trilha sonora original da obra: duas de Chico Buarque (que Izabella Bicalho faz questão de não revelar) e três inéditas, compostas pelo diretor musical da remontagem, Roberto Bürgel. Mas a carga dramática da trama de "Gota d'água" fez com que a maior preocupação de Izabella Bicalho com um dos principais musicais do teatro brasileiro, cuja musicalidade está não só na trilha mas também no texto, todo rimado, não tenha sido a música, e sim a interpretação.

- Nos outros musicais que já fiz, a importância maior ia para a parte musical, que era o que eu precisava ensaiar mais. Aqui, não. Ainda bem que chamei o João Fonseca para nos dirigir, porque ele é um grande diretor de ator. Além de ser muito, muito detalhista - destaca Izabella, acrescentando que está se sentindo tendo ganhado outra família, pois há dois meses ensaia oito horas por dia, todos os dias, com o elenco do espetáculo. - Uma das minhas filhas, a Maria Ingrid, de 10 anos, ia tanto aos ensaios, e me ajudava tanto a passar o texto, que o João (Fonseca) disse: "Olha, tenho que botar sua filha, tá?". E ela vai ser um dos filhos assassinados. Ganhou o papel¡

Izabella Bicalho nunca assistiu a uma montagem de "Gota d'água", mas diz que, para construir sua Joana, não teve como não prestar atenção na atuação histórica de Bibi Ferreira, vista e ouvida por ela por meio de fotos e gravações.

- O que mais aparecia ali era a intensidade da Bibi. E a voz ao dizer o texto, que era irretocável - afirma Izabella Bicalho, "uma pessoa que adora uma desgraça". - Sou formada em Antropologia e fiz uma especialização em tragédia grega. Tragédias, para mim, significam catarse; uma catarse pelas lágrimas. Por isso, o mais difícil foi não me deixar cair no drama, não exagerar. Quando comecei a ensaiar, eu colocava toda uma carga de expressividade na história. Com o tempo, fui vendo que, quanto mais simples eu fazia a coisa, mais quem estava me vendo se emocionava. Menos sempre é mais, principalmente numa tragédia.


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