segunda-feira, 4 de maio de 2009

Crítica social viaja ao som da bossa nova


Foi uma sala quase esgotada a que acolheu a estreia do musical brasileiro Gota d'Água, em Guimarães, para ver a reinvenção da tragédia grega pela pena de Chico Buarque.


Centro Cultural Vila Flor, Guimarães, 1 de Maio de 2009


Com músicos ao vivo e parco em cenografia, a riqueza de Gota d’Água, o espectáculo escrito por Chico Buarque e Paulo Pontes, reside precisamente na riqueza do texto e na qualidade dos actores que o representam (e este verbo representar inclui aqui cantar ao vivo, dançar e por vezes ainda tocar instrumentos musicais).

O musical inspirado na tragédia Medeia, de Eurípedes, iniciou a digressão portuguesa no Centro Cultural Vila Flor, em Guimarães. O protagonista masculino, Jasão, é um bon vivant, autor do samba Gota d’Água, que está a alcançar grande sucesso nas rádios, e está noivo de Alma, a filha de Creonte, um homem de negócios de ética duvidável. No bairro onde Jarsão vivia, suspeita-se que seja o sogro de Jarsão quem paga para o samba Gota d’Água ter tanto êxito nas telefonias. Para Creonte, Jarsão não é de todo o genro com que sonhou, mas está numa empreitada para o tornar o mais próximo possível do que esperava para a sua filha.

Joana, a mulher com quem Jarsão viveu dez anos no bairro e que, de repente, se vê abandonada e com os dois filhos pequenos para criar, está submergida num misto de dor profunda e raiva. Enquanto isso o ex-companheiro anda entretido nos preparativos para a boda e a herdar os negócios do futuro sogro. Depois de abandonada e maltratada, Joana decide vingar-se de quem a fez sofrer, num extraordinário desempenho da actriz Izabella Bicalho.

O coro é encarnado pelos vizinhos do bairro onde Jarsão e Joana moraram: três mulheres e três homens. Estas personagens secundárias vão fazendo o enquadramento do passado do casal e da evolução da história. O espectáculo alinha-se com vários fios: o dinheiro mal repartido, as relações baseadas no interessse, o egoísmo e aproveitamento dos mais fracos pelos mais fortes, tudo ao ritmo da bossa nova e com aquela espontaneidade que só os actores brasileiros conseguem.

A crítica social, a ambiguidade das personagens, que vagueiam entre a luz e a sombra, são intemporais e por isso mesmo o texto faz tanto sentido no Brasil dos anos 70 como no Portugal do séc. XXI. A Guimarães, seguem-se Lisboa, Estarreja, Figueira da Foz, Porto e Faro. Tudo durante o mês das noivas.


Fonte: rascunho.net


Um comentário:

  1. Que bom que os portugueses estão podendo apreciar um dos melhores musicais brasileiros de 2008. E um autenticamente brasileiro (e não importado da Broadway como vários outros que estiveram e estão ainda em cartaz) mas igualmente de nível alto.

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